Que atire a primeira GoPro o surfista que nunca desejou se ver surfando. A relação do surf na construção e percepção da autoimagem talvez seja a origem da intensidade e propriedade que todo surfista, uma hora ou outra, sente que tem sobre o surf. É como se ele fosse território próprio. Eco de si mesmo. Um espelho de quem somos.

Todo o complexo de sentimentos, sensações e motivações que engloba o ato de surfar só poderia vir mesmo de algo extremamente pessoal. Da relação mais íntima que nutrimos por nós mesmos.

Narciso, eco e o surf

Se houvesse uma prancha de surf dando mole em algum canto da mitologia grega, certamente Narciso seria o surfista. O mito de Narciso tem algumas versões, mas todas com a mesma moral da história. Atordoado com a beleza da imagem que viu refletida na água, Narciso morreu tentando alcançar fora de si o próprio reflexo de quem era.

Filho do deus Cefiso e da ninfa Liríope, Narciso era tão bonito que despertava a atenção de homens e mulheres por onde passava. Um belo dia, a ninfa Eco, perdidamente apaixonada por ele, seguiu seus passos admirando sua beleza de longe. Ao sentir que alguém o observava, Narciso quis saber: “Quem está aí”? Eco, amaldiçoada a não poder se expressar, só era capaz de repetir as palavras que ouvia, e respondeu: “Está aí”. Confuso com a impossibilidade de encontrar a voz que ecoava exatamente o que vinha dele, Narciso parou diante de um lago, onde viu pela primeira vez seu reflexo em uma superfície espelhada. Acreditando ser aquela imagem a dona da voz com a qual havia conversado, mergulhou hipnotizado em busca da consumação daquela paixão e se afogou tentando alcançar o próprio reflexo.

Mas e o surf com isso?

É inegável que a relação de todo surfista com o surf vai muito além da atividade física. Não é raro, por exemplo, dar respostas pessoais para perguntas impessoais. Certamente você já chegou na praia, encontrou um conhecido saindo do mar com a prancha debaixo do braço e quis saber: “Como tá o mar?” E como resposta, ouviu algo assim: “Peguei altas” ou “Surfei que nem um prego hoje”. Isso é porque dificilmente o surfista consegue dissociar o surf de si mesmo. É como se o surf fosse parte dele próprio, eco do que quer dizer ao mundo sobre si mesmo. E muito provavelmente, é. O surf pode ser a parte mais bela de si mesmo que o sujeito deseja mostrar ao mundo. Pode ser o espaço interno do qual provavelmente mais nos orgulhamos e com o qual mais nos identificamos.

O problema, assim como aconteceu com Narciso, começa quando a relação interna passa a ser um problema ao se relacionar com o externo. Especialmente sendo o surf um ambiente democrático, de todos. Onde necessitamos espelhar quem somos ou desejamos ser, mas onde muitas vezes acabamos ecoando verdades que não condizem com a nossa própria.

Complexo? É sim, como as coisas mais belas da vida. Quer ouvir o eco desse amor todo em ondas sonoras digitais? Então, dá o play aqui:

[skin-link-button text=”Fale com o Surf de Mesa no Telegram” url=”http://t.me/surfdemesa” custom_colors=”false” txt_color=”#353535″/]

Além do Spotify, você também pode ouvir o Surf de Mesa nas plataformas iTunes, Google Podcasts, Deezer e Spreaker.

[skin-wave-divider position=”horizontal” align=”center” color=”#353535″ animate=”true”/]

Já conhece o outro podcast da Flamboiar? SURF ZINE repercute as principais notícias e dicas do surf na semana para quem quer chegar bem informado no lineup.