Fotos: Stab/Nate Lawrence
Na terra do sol nascente, o Stab High Japão 2025 transformou a piscina PerfectSwell Shizunami no palco do surf mais fora da curva. O evento, que já nasceu desafiando convenções, voltou esse ano ao Japão com ainda mais força, elevando o nível do surf aéreo e dando espaço para que as atuais e novas gerações mostrassem do que são feitas. Entre os 60 surfistas divididos em quatro categorias (Pro Men, Pro Women, Ladybirds e Bottle Rockets), três brasileiros fizeram do Japão uma extensão da costa atlântica: Pedro Barros, Mateus Herdy e o jovem fenômeno Arthur Vilar, que brilhou na categoria Bottle Rockets e saiu como vice-campeão.
A lógica do Stab High é outra: vale a criatividade, o risco, a ousadia, o impossível. Cada surfista tem múltiplas chances para voltar de seus melhores aéreos, e só eles contam. Claro que os brasileiros mostraram estar perfeitamente confortáveis. Pedro Barros, com sua bagagem do skate e do bowl, trouxe manobras que transformam a onda em pista. Já Mateus Herdy, nome consolidado do surf nacional, manteve sua assinatura fluida mesmo nos aéreos mais agressivos.
Mas foi Arthur Vilar, o grom da trupe brasileira, que mais fisgou a atenção e o coração da torcida. Disputando na categoria Bottle Rockets (meninos até 15 anos), Arthur não apenas garantiu um lugar na final, como se manteve entre os mais consistentes da divisão. Seu estilo mistura técnica apurada com fome de mar, e isso transparece nas manobras que executou no novo pico do evento, a seção “McFly”, construída para alavancar voos ainda mais altos.
Arthur Vilar: gravidade é só um detalhe
A final dos Bottle Rockets foi a camadas estratosféricas com Arthur e o australiano Loci Cullen puxando o nível um do outro. Os juízes não aliviaram: estavam exigindo amplitude, controle e criatividade. Arthur respondeu à altura com aéreos que arrancaram aplausos de surfistas veteranos e jurados céticos. Seu melhor voo o levou direto para o segundo lugar.
“Ele pode voltar do maior aéreo da vida, dar um snap e entrar num tubo. Não desperdiça nada da onda”, comentou Stace Galbraith, um dos comentaristas durante a transmissão. A frase resume bem a disposição brasileira no Stab High e na vida: surfar até o último segundo, sem freio, com entrega total. “Acho incrível isso nos brasileiros: eles aproveitam cada segundo da onda. Têm uma sede, uma energia”.
Lee Wilson e o critério do double grab levado ao extremo
Em um evento onde o estilo e a ousadia são as moedas válidas, o julgamento ainda carrega suas próprias peculiaridades. E nenhum juiz teve tanto impacto nos resultados quanto Lee Wilson. Com fama já conhecida entre os competidores, ele é notório por rebaixar notas de manobras que envolvem double grabs, mesmo que tecnicamente exigentes.
Durante a transmissão, a crítica foi direta: “se você já viu um Stab High na vida, sabe que Lee Wilson não vai pontuar uma manobra com double grab.” E esse rigor levado a níveis questionáveis não passou despercebido. Arthur Vilar, que vinha apostando no kerrupt flip como sua manobra mais potente, com um toque técnico que exige domínio absoluto, sofreu diretamente com esse critério elevado por Lee a um patamar de rigidez irracional.
Ainda que sua performance tenha sido amplamente elogiada e o vice-campeonato garantido, ficou no ar a sensação de que, com um juiz menos controverso no painel, o próprio evento ganharia.
Entre a nova guarda e os veteranos: um palco compartilhado
Mesmo em meio a nomes como Julian Wilson, Mikey Wright e Albee Layer, os groms não ficaram à sombra. Ao contrário: roubaram a cena. Na Pro Men, aos 18 anos, o australiano Hughie Vaughan, que em 2024 estava na cabine de transmissão por conta de uma lesão, voltou ao lineup e saiu como campeão.
Na divisão feminina, o protagonismo foi dividido entre a elite e a base. Sierra Kerr, que já venceu outras edições do Stab High na categoria Ladybird, venceu o Pro Women dessa vez. Esse foi o primeiro ano da categoria Pro feminina, onde competiram somente quatro surfistas, mostrando que as aerealistas vêm sendo formadas conforme o estímulo às novas gerações de surfistas vem se consolidando. A californiana Eden Walla, na Ladybirds, levantou o evento com sua técnica e amplitude que já rivalizam com as profissionais. Mali Adam, que deu seu primeiro aéreo há um mês, chegou à final. O recado é claro: as garotas estão prontas.
Bottle Rockets: o futuro é agora
O sucesso da categoria Bottle Rockets foi tanto que o campeão Loci Cullen foi levado à grande final do Pro Men. Não venceu, mas mostrou que a categoria dos groms não é mais apenas vitrine: é campo de batalha. Com um novo status na cena, Loci e Arthur Vilar deixaram claro que o próximo campeão pode estar no colégio hoje e aterrissando com perfeição amanhã.
Onde a camaradagem também vence
Um dos pontos altos do Stab High é o espírito do evento. Mikey Wright, que no primeiro dia protagonizou um dos melhores aéreos da história da competição (levando o título de Monster Air) e chegou a surfar ao som da música de seu próprio casamento na final, celebrou mais a vitória de Hughie do que a sua. “A energia aqui é diferente. Todo mundo quer ver o outro acertar”, disse um dos comentaristas.
Para Arthur Vilar, essa energia foi combustível. Recebeu conselhos de veteranos, foi celebrado por gringos e entrou na memória de quem acompanhou a final. “Você vai lembrar desse nome”, garantiu um dos apresentadores logo após sua última manobra.
O saldo da missão brasileira no Japão
Pedro Barros e Mateus Herdy reforçaram que o Brasil tem voz alta e ativa no surf progressivo. Mas foi Arthur Vilar quem saiu do Japão como nome a ser anotado, sublinhado e seguido. A vice-liderança na Bottle Rockets é mais do que um troféu: é a confirmação de que o espaço entre o limite do lip e o céu é apenas o começo.