Apresentado por

Texto por Carolina Bridi | Fotos por Raphael Tognini, Bruno Tessari e Ana Romanio

A cabeça de Tomas Hermes funciona em frames.

Ele não curte muito falar de si mesmo, mas quando o encontramos duas semanas atrás, tentamos entender por onde costuma passear sua cabeça enquanto seus pés andavam, devidamente equipados com o UltraRange 2.0, entre o piche de São Paulo e a areia de Barra Velha.

“Eu acho que vocês vão ter que fazer vários cortes pra achar as palavras aí no meio.”

Foi o que ele disse enquanto conversávamos, já pensando em como iríamos montar essa história.

Isso é o que acontece com uma cabeça criativa. Ela está sempre pensando em formas, formatos; em quadros, enquadramento; em luz e sombra. Aquela angústia criativa de quem precisar vomitar um pouco as coisas.

 “Quando tu cria muito, tua cabeça e teus olhares estão sempre buscando um caminho, ou vendo um caminho a mais.”

E separar isso internamente é muito, muito difícil. Mas ele encontrou seu jeito.

Filipe Toledo, Miguel e Samuel Pupo.
Bruno Zanin segurando comida e durante gravação de filme no Hawaii

Equilíbrio entre preto e branco

Desde os 13 anos Tomas sobrevive por conta própria completamente do surf. Isso significa entrar num nível de pressão muito grande desde cedo. A sorte é que sempre gostou da pressão competitiva, e se a competição pressionava, o surf era a válvula de escape. Tomas ficou bom em lidar com essa dualidade, de encontrar a luz e a sombra exatamente no mesmo espaço. O físico, o concreto do que é a matéria do mar – a água, ao mesmo tempo tão fluida e etérea quanto a sensação que ela provoca a quem se entrega.

Foi assim que seu olhar ficou treinado. Se a válvula de escape estava exatamente no mesmo ambiente de onde vinha a pressão, ele não tinha outra opção senão enxergar tão profundo a ponto de distinguir visualmente o preto do branco dentro de toda área cinzenta. Assim funciona o equilíbrio interno de Tomas Hermes.

Quando a cabeça pira excessivamente na parte criativa, vai só surfar uma semana inteira. Se algo não está saindo, não está fluindo, sua maneira de jogar para fora, é dentro da água. Assim como quando a fissura no surf vai além, o equilíbrio é fora. “Esses dois automaticamente viraram meus pontos de equilíbrio. Aquela vontade de falar um monte de merda, jogar tudo para fora que, caramba, tá tudo errado… Eu já não tenho mais porque eu tenho um pouco desses dois mundos.

“Um equilibra o outro.”

Os quadros pelo caminho

Enquanto caminha na rua, Tomas está sempre olhando. “Vejo uma cena que eu falo: ‘pô, que legal aquilo ali. Uma foto ficaria irada naquele momento.”

Desde criança, Tomas consumiu muito o surf em todos os sentidos por conviver com gente criativa no meio. Consome muita arte, design, criação. Ao mesmo tempo, se vê como um surfista fissurado, daqueles que, se deixar, surfa todo dia.

“Quanto mais velho eu fico, mais dá vontade de surfar.”

Gosta de filme de surf, gosta de quem cria, gosta de museu, gosta de exposição. Gosta dos malucos que criam coisas aleatórias. Tudo que consome dentro ou fora do surf vai entrando na sua cabeça e, simplesmente, às vezes pára pra pensar nas coisas. Seu olhar chama para tudo aquilo que parece ter sido feito a partir do que as pessoas são. É disso que traz mais referência. “É uma coisa que tu ama e conecta. E sai de ti. Não tem nada pensado. Esse universo só vem de dentro mesmo.”

Miguel e Samuel Pupo montando quebra-cabeça durante etapa do CT no Hawaii

A forma e o desapego

Hoje em dia Tomas se vê mais desapegado para expressar o que gosta em um ambiente em que nem sempre sentiu total liberdade.

“Acho aquela coisa bonita. Enquadramento, às vezes… Eu gosto do contraste. Um lado que tá preto, um lado que tá branco. Eu procuro equilibrar isso. Mas (foi um processo) até eu me dar liberdade de falar, ‘cara… eu gosto disso, eu vou colocar isso, a minha maneira de ver sem me importar muito com os olhares ou se aquilo tá ligado ou não ao surf’.”

Capturar segundos que chamam seu olhar, ao mesmo tempo em que dão a Tomas um respiro do surf, também o conectam com o meio.

“Por mais fora do surf que pareça, todas essas conexões, fotografia e olhares me conectam mais com o surf.”

Já se sentiu um ET entre a galera, principalmente nas surf trips, por querer explorar o meio onde estava, dar um rolê fora de tudo que estava enquadrado na alta performance e naquela área da praia onde o surf acontece.

“O que eu vivi no surf sempre teve um ‘caramba, o que é esse cara? O que ele tá fazendo aqui?’. É um meio muito louco. De certa forma, ele é um pouco solitário. São coisas muito profundas, e as coisas profundas são difíceis de serem compartilhadas com emoção.”

Acha mais fácil compartilhar coisas concretas, por isso transforma tudo em imagens.

São elas que permitem a Tomas transferir, não exatamente como é seu lado de dentro, mas algo mais próximo do sentimento. Algo que o faz conviver melhor nesse meio. É sua arte que permite trocar uma ideia em contextos que nem sempre casam com o seu.

“Acho que só quando o cara vai ficando mais velho que começa a entender que cada um tá num rolê diferente.”

A liberdade de polir

Tudo começou a fazer mais sentido a partir do momento que ele começou a surfar com pranchas alternativas. Foi quando encontrou um pouco mais de liberdade dentro da água pra se expressar. Buscar ângulos é como surfar com pranchas diferentes. Universos diferentes, mas juntos.

Por isso, a maneira que se expressa dentro da água hoje em dia é uma conexão de como se expressa fora, na criação, na edição, na fotografia

“Surfar de biquilha me fez fluir muito mais, me fez tirar o excesso de movimento. Eu sempre fui um cara muito rápido, muito ativo, mas eu queria polir mais (meu surf). E aquela criação dentro da água une os dois mundos. Mas tu precisa da liberdade de criar dentro da água sem compromisso, vamos dizer assim, de ter que performar.”

E isso não significa que Tomas não gosta de performance.

Quem é Tomas Hermes agora

Transitar por todas essas partes do surf, da competição ao freesurf à arte, molda quem é Tomas Hermes. Não há desconexão entre o lado competitivo de sua formação e o lado criativo de sua existência. Tomas sabe que não estaria surfando da maneira que surfa hoje se tivesse ficado em um só destes lados.

Por mais que surfe de prancha alternativa, Tomas chega no mar querendo quebrar com esta prancha alternativa. Sem elas, não teria chegado no nível de surf livre que tem hoje. Mas sem a vida passada na competição, não seria o Tomas que busca as melhores rasgadas com uma biquilha.

“Casar esses dois universos, o totalmente high performance e a parte artística, expressam quem eu sou como surfista hoje.”

 

É por isso que dificilmente os pés de Tomas buscam caminhos feitos só de areia ou só de asfalto. Não importa onde esteja e para onde vá, ele sempre vai buscar os dois lados

Vai ser difícil ver Tomas em um lugar sem onda, ou em um lugar que tenha só onda.

A busca eterna será sempre a de encontrar lugares onde pegue um swell e possa explorar o lugar de outras formas também.

“Acho que todos os lugares têm um pouco disso.”

Afinal, muito do caminho está na cabeça de quem o faz.

Assista ao filme ‘Cabeça, Tomas, Surf e Pé’

Apresentado por

Texto por Carolina Bridi | Fotos por Raphael Tognini, Bruno Tessari e Ana Romanio

A cabeça de Tomas Hermes funciona em frames.

Ele não curte muito falar de si mesmo, mas quando o encontramos duas semanas atrás, tentamos entender por onde costuma passear sua cabeça enquanto seus pés andavam, devidamente equipados com o UltraRange 2.0, entre o piche de São Paulo e a areia de Barra Velha.

“Eu acho que vocês vão ter que fazer vários cortes pra achar as palavras aí no meio.”

Foi o que ele disse enquanto conversávamos, já pensando em como iríamos montar essa história.

Isso é o que acontece com uma cabeça criativa. Ela está sempre pensando em formas, formatos; em quadros, enquadramento; em luz e sombra. Aquela angústia criativa de quem precisar vomitar um pouco as coisas.

“Quando tu cria muito, tua cabeça e teus olhares estão sempre buscando um caminho, ou vendo um caminho a mais.”

E separar isso internamente é muito, muito difícil. Mas ele encontrou seu jeito.

Equilíbrio entre preto e branco

Desde os 13 anos Tomas sobrevive por conta própria completamente do surf. Isso significa entrar num nível de pressão muito grande desde cedo. A sorte é que sempre gostou da pressão competitiva, e se a competição pressionava, o surf era a válvula de escape. Tomas ficou bom em lidar com essa dualidade, de encontrar a luz e a sombra exatamente no mesmo espaço. O físico, o concreto do que é a matéria do mar – a água, ao mesmo tempo tão fluida e etérea quanto a sensação que ela provoca a quem se entrega.

Foi assim que seu olhar ficou treinado. Se a válvula de escape estava exatamente no mesmo ambiente de onde vinha a pressão, ele não tinha outra opção senão enxergar tão profundo a ponto de distinguir visualmente o preto do branco dentro de toda área cinzenta. Assim funciona o equilíbrio interno de Tomas Hermes.

 

Quando a cabeça pira excessivamente na parte criativa, vai só surfar uma semana inteira. Se algo não está saindo, não está fluindo, sua maneira de jogar para fora, é dentro da água. Assim como quando a fissura no surf vai além, o equilíbrio é fora. “Esses dois automaticamente viraram meus pontos de equilíbrio. Aquela vontade de falar um monte de merda, jogar tudo para fora que, caramba, tá tudo errado… Eu já não tenho mais porque eu tenho um pouco desses dois mundos.”

“Um equilibra o outro.”

Os quadros pelo caminho

Enquanto caminha na rua, Tomas está sempre olhando. “Vejo uma cena que eu falo: ‘pô, que legal aquilo ali. Uma foto ficaria irada naquele momento.”

Desde criança, Tomas consumiu muito o surf em todos os sentidos por conviver com gente criativa no meio. Consome muita arte, design, criação. Ao mesmo tempo, se vê como um surfista fissurado, daqueles que, se deixar, surfa todo dia.

“Quanto mais velho eu fico, mais dá vontade de surfar.”

Gosta de filme de surf, gosta de quem cria, gosta de museu, gosta de exposição. Gosta dos malucos que criam coisas aleatórias. Tudo que consome dentro ou fora do surf vai entrando na sua cabeça e, simplesmente, às vezes pára pra pensar nas coisas. Seu olhar chama para tudo aquilo que parece ter sido feito a partir do que as pessoas são. É disso que traz mais referência. “É uma coisa que tu ama e conecta. E sai de ti. Não tem nada pensado. Esse universo só vem de dentro mesmo.”

A forma e o desapego

Hoje em dia Tomas se vê mais desapegado para expressar o que gosta em um ambiente em que nem sempre sentiu total liberdade.

“Acho aquela coisa bonita. Enquadramento, às vezes… Eu gosto do contraste. Um lado que tá preto, um lado que tá branco. Eu procuro equilibrar isso. Mas (foi um processo) até eu me dar liberdade de falar, ‘cara… eu gosto disso, eu vou colocar isso, a minha maneira de ver sem me importar muito com os olhares ou se aquilo tá ligado ou não ao surf’.”

Capturar segundos que chamam seu olhar, ao mesmo tempo em que dão a Tomas um respiro do surf, também o conectam com o meio. “Por mais fora do surf que pareça, todas essas conexões, fotografia e olhares me conectam mais com o surf.”

Já se sentiu um ET entre a galera, principalmente nas surf trips, por querer explorar o meio onde estava, dar um rolê fora de tudo que estava enquadrado na alta performance e naquela área da praia onde o surf acontece.

“O que eu vivi no surf sempre teve um ‘caramba, o que é esse cara? O que ele tá fazendo aqui?’. É um meio muito louco. De certa forma, ele é um pouco solitário. São coisas muito profundas, e as coisas profundas são difíceis de serem compartilhadas com emoção.”

Acha mais fácil compartilhar coisas concretas, por isso transforma tudo em imagens.

São elas que permitem a Tomas transferir, não exatamente como é seu lado de dentro, mas algo mais próximo do sentimento. Algo que o faz conviver melhor nesse meio. É sua arte que permite trocar uma ideia em contextos que nem sempre casam com o seu. “Acho que só quando o cara vai ficando mais velho que começa a entender que cada um tá num rolê diferente.”

A liberdade de polir

Tudo começou a fazer mais sentido a partir do momento que ele começou a surfar com pranchas alternativas. Foi quando encontrou um pouco mais de liberdade dentro da água pra se expressar. Buscar ângulos é como surfar com pranchas diferentes. Universos diferentes, mas juntos.

Por isso, a maneira que se expressa dentro da água hoje em dia é uma conexão de como se expressa fora, na criação, na edição, na fotografia. “Surfar de biquilha me fez fluir muito mais, me fez tirar o excesso de movimento. Eu sempre fui um cara muito rápido, muito ativo, mas eu queria polir mais (meu surf). E aquela criação dentro da água une os dois mundos. Mas tu precisa da liberdade de criar dentro da água sem compromisso, vamos dizer assim, de ter que performar.”

E isso não significa que Tomas não gosta de performance.

Quem é Tomas Hermes agora

Transitar por todas essas partes do surf, da competição ao freesurf à arte, molda quem é Tomas Hermes. Não há desconexão entre o lado competitivo de sua formação e o lado criativo de sua existência. Tomas sabe que não estaria surfando da maneira que surfa hoje se tivesse ficado em um só destes lados.

Por mais que surfe de prancha alternativa, Tomas chega no mar querendo quebrar com esta prancha alternativa. Sem elas, não teria chegado no nível de surf livre que tem hoje. Mas sem a vida passada na competição, não seria o Tomas que busca as melhores rasgadas com uma biquilha.

“Casar esses dois universos, o totalmente high performance e a parte artística, expressam quem eu sou como surfista hoje.”

É por isso que dificilmente os pés de Tomas buscam caminhos feitos só de areia ou só de asfalto. Não importa onde esteja e para onde vá, ele sempre vai buscar os dois lados.

Vai ser difícil ver Tomas em um lugar sem onda, ou em um lugar que tenha só onda.

A busca eterna será sempre a de encontrar lugares onde pegue um swell e possa explorar o lugar de outras formas também.

“Acho que todos os lugares têm um pouco disso.”

Afinal, muito do caminho está na cabeça de quem o faz.

Assista ao filme ‘Cabeça, Tomas, Surf e Pé’