Desde que uma pacata vila de pescadores foi descoberta entre viagens a Búzios e Cabo Frio por surfistas cariocas na década de 1970, tem sido destino dos maiores eventos de surf no Brasil. Por isso, neste episódio do Surf de Mesa, Rapha Tognini e Carol Bridi conversam com a voz da praia de Itaúna para entender os motivos que levaram Saquarema não só a se tornar, mas principalmente se manter até hoje como palco principal das competições de nível internacional da modalidade no país.

Ronaldo Monteiro, mais conhecido como Jacaré, é locutor de praia destes grandes eventos e pisou nas areias de Saquarema pela primeira vez em 1973. Foi no embalo da turma do Arpoador, seguindo os rumos que as grandes referências do surf estavam tomando na época, que ele acampou pelas primeiras vezes nas areias de Itaúna. Em tempos de ditadura, aquele era o canto perfeito para quem almejava fugir às normas.

Festival de 76

Caras como Ricardo Bocão, Pepê Lopes, Paulo Proença, Octávio Pacheco, Daniel Friedman e o resto da turma foram os responsáveis pela descoberta do pico que, além da geografia favorecida para as ondas, estava bem distante da repressão militar. Nada mais natural que a juventude se colocasse em procissão rumo a um oásis sem regras em busca de liberdade. Foi assim que Saquarema virou o Woodstock brasileiro em 1976.

Ao festival de surf que tinha rolado em Itaúna em 75, no ano seguinte se somou um festival de música organizado por Nelson Motta. Com grandes nomes do rock que despontavam na época, como Raul Seixas, Rita Lee e Angela Ro Ro, surgiu um dos mais lendários festivais do Brasil. O ‘Som, Sol & Surf Saquarema’ foi divisor de águas na história do rock e do surf brasileiro. Dali pra frente, nada mais seria igual. A cidade, o rock e o surf entraram no mapa do Brasil depois de tudo que aconteceu naqueles três dias em Saquarema.

Jacaré, que estava lá e por lá permanece até hoje, fala não só sobre como o festival de 76 impactou a comunidade, mas também como os eventos de surf moldam o desenvolvimento da cidade até hoje, passando pelos inevitáveis paradoxos entre ideais e evolução com que o surf convive ao longo de sua história.

Festival de 76. (Imagem do documentário ´Som, Sol e Surf - Saquarema´)

Festival de 76. (Imagem do documentário ´Som, Sol e Surf – Saquarema´)

Por que Saquarema?

1975, ano do primeiro festival de surf realizado em Saquarema, também foi o ano em que Jacaré alugou seu primeiro canto na cidade. Desde 1980, quando se fixou na cidade, constituiu família e se tornou parte da história do surf local, acompanhando dos bastidores os grandes eventos internacionais.

Não só a história do surf na região como a versatilidade das ondas fazem de Saquarema o palco preferido destas competições. Das longas esquerdas de Itaúna clássica aos tubos da Barrinha, soma-se a capacidade de segurar ondas de mais força e energia comparada a picos gringos.

Há tradição, história e boas ondas ao longo de toda a costa brasileira, incluindo os extremos de Sul a Nordeste? Óbvio que há. Mas é inegável também a força logística proporcionada pela localização geográfica central. Até aí, o litoral de São Paulo, com picos que representam tradicionais potências do surf no Brasil, continuaria no páreo. Mas aí entra na equação talvez o que se impõe como fator determinante: investimento. A sacada pelo Poder Público de que o surf é parte fundamental da economia local fez com que ele entrasse no orçamento da cidade. E aí, fica inquestionável: nesse ponto, Saquarema saltou à frente.

A voz de Itaúna

Dos 70s aos 2020s, passando pelo primeiro QS na década de 90 até a chegada do CT em 2002 e sua volta definitiva a partir de 2017, muita coisa mudou na cidade. Mas de lá pra lá, uma coisa é certa: a vocação de Saquarema para os festivais de surf permanece intacta. Tanto é que de 24 a 30 de abril rola mais uma edição do Saquarema Surf Festival, válido pelo único QS 5000 da temporada 2023/2024 no Brasil e também pelos rankings regionais Pro Junior e Longboard Pro da WSL América Latina.

E a voz de Jacaré, que você ouve ao dar o play aqui neste episódio do podcast, também ecoa novamente pelas areias de Itaúna a partir da próxima segunda-feira.

 

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